Avançar para o conteúdo principal

Sobre o Caso Ronaldo

Quem me conhece sabe que não sou uma Feminista. Posso até parecer, por considerações do público geral, mas não sou nem me considero. Sou, sim, indubitavelmente Humanista e muito orgulhosa de ser Mulher. Não aceito o conceito de sexo fraco e muito menos a sensação de impotência que muitas vezes vem associada à palavra "vítima". Não defendo quem acha que todo o flirt é assédio, nem uso tshirts com hashtags porque para mim cada caso é um caso e tornar um acontecimento numa tendência e uma tendência numa certeza absoluta nunca levou nada a lado nenhum que representasse uma real e profunda mudança de comportamentos. 

Nunca como hoje se falou tanto de violência sexual, mas apesar de nos inícios dos movimentos sociais que por aí andam, como uma onda de mudança, tanta coisa boa e válida se ter dito, parece que agora novas marés trazem lixo generalista, daquele que envenena as boas causas. Isto dito, espero que não surjam equívocos sobre o que vou falar.

Do caso em si penso pouco, não estive a dançar com eles na festa, nem fui à penthouse. Não sei se é verdade, se não é, se foi consensual ou não, ou sequer se houve sexo. Não me compete afirmar nada e o que eu pudesse afirmar seriam citações de fontes e a minha opinião sobre elas, que vale tanto para o caso como zero. Por isso vou falar do caso da Opinião Pública no caso Ronaldo, sim?

Mais do que Portuguesa, sou Mulher. Por isso, estou profundamente surpreendida com algumas coisas que tenho lido nas redes sociais e ouvido nas ruas. Pasmo perante a quantidade de santos e santas que andam por aí a cuspir venenosos "ela é que se estava a fazer a ele por causa do dinheiro" e "ela teve o que merecia". Vejamos:

No primeiro caso, estamos a assumir que ele é uma vítima ignorante da malvadez humana, atacado por uma mulher predadora, que foi inocentemente levado a fazer uma má escolha porque é fraco, incapaz de tomar uma decisão consciente e em conformidade com o seu estatuto e para segurança da sua boa imagem, porque era a primeira vez que era abordado por uma mulher numa discoteca, e o mundo é cheio de boas intenções e todos procuramos o amor. Isso ou assumimos que foi tudo por telecomando do pénis. E pode bem ser verdade tudo isto, afinal de contas já todos caímos num engodo e a chico-espertice é coisa de ambos os sexos. Mas…

O caso muda de figura quando chegamos ao "ela teve o que merecia". Aqui, os que assim afirmam, estão a assumir que uma mulher foi violada e que MERECIA porque seduziu, roçou e subiu para o apartamento. Ou seja, uma mulher ao assumir a sua sensualidade e ao provocar coloca-se "a jeito", como também ouvi, de ser violada porque estava a "pedi-las". Como se a violação fosse uma reguada no rabo das más meninas, é isso? E isto, minha gente, isto é que não pode ser. Isto sim mostra uma dualidade de julgamentos que é daquelas coisas que vai apodrecendo as causas sociais no seu âmago. 

Ninguém, nunca, fez coisa alguma para que fosse merecedora de violação. Mesmo que ela esteja a mentir, só o simples facto de aceitarmos este género de pensamento é como dar uma facada em séculos de emancipação feminina, facada essa mais profunda tendo em conta que muitas mulheres estão a expressar esta opinião. 

Infelizmente este é um daqueles casos em que ninguém vai sair bem na fotografia, porque a vida não é um smartphone em que temos a oportunidade de tirar a melhor selfie para tornar a realidade mais bonita… Mas vamos fazer um exercício simples:

- Faz de conta que retirávamos à história o nome dos seus intervenientes e o mediatismo do caso. Passava a ser algo que tinha acontecido entre dois vizinhos, daqueles que mal conhecemos. A história foi contada nas escadas do prédio. 

Qual seria a nossa opinião sobre este acontecimento entre vizinhos, a quem iriamos atribuir a culpa e quem assumiríamos como vítima? 

É que se a resposta que damos a esta questão muda conforme o nome dos intervenientes e o mediatismo, então NÓS é que não estamos a ficar muito bem na fotografia, certo? 

Nacionalismo e Moralismo são duas ideias de convívio perigoso, assim repletas de extremismo… pensava que a História já tinha ensinado isso…

Parece que não.


Comentários

Mensagens populares deste blogue

Sobre o Casamento e a Maternidade (parte 1)

Não sou casada e não planeio casar. Não sou mãe e não planeio ser. Nunca brinquei com nenucos, pelo menos não que me lembre saudosamente. Também nunca babei frente à loja de noivas ou sequer suspirei perante fotos de bebés gordos. Nunca fiz uma lista de desejos para o casório, muito menos imaginei um filho meu nos braços do meu marido, porque para isso seria preciso imaginar um marido, coisa que também não fiz. Tudo isto não faz de mim menos mulher, menos pessoa e não quer dizer que não goste de crianças, que seja má e tantas outras coisas que tanta gente diz a quem escolhe como eu escolhi. Por isso, porque estou nos 33, porque tenho muitas amigas que têm de lidar em modo repeat com as perguntas "então, já casaste?" e a "e filhos?" apenas para depois serem olhadas de soslaio, achei por bem falar sobre isto porque nunca se sabe se alguma mulher na casa dos trinta, que visite aqui o estaminé, possa estar a passar pelo mesmo.  Primeiro, vamos lá falar sobre

O meu lema de vida. Sem dúvida.

Religiões à parte, desde bem pequenina sempre senti que Algo (seja qual for o nome que queiram dar-lhe, ou seja o quê ou em quem for que acreditem) me enchia de forças para superar a adversidade. Nem sempre tive uma vida fácil, nem sempre tudo correu bem, mas no meio das tempestades, inexplicavelmente às vezes, sempre acreditei que nunca me faltaria o suficiente para sobreviver e crescer no meio das dificuldades. Eduquei-me para acreditar, acima de tudo, na minha capacidade de criar a minha própria sorte, mesmo que às vezes esta sorte viesse disfarçada de azares dos grandes. Forcei-me a levantar-me sem pensar que o peso do que carregava aos ombros me toldava os joelhos. Aprendi a usar muletas emocionais para quando cambaleava depois de mais um medo, e outro e outro... e a não questionar, mas sim aceitar, agir, resolver e continuar. Das imensas escolhas erradas que já fiz na minha vida tirei a minha aprendizagem, às vezes às custas de muitas reguadas nas mãos. Ainda não aprendi tudo, mu